A fala da secretária de Imprensa da Casa Branca, Karoline Leavitt, de que os Estados Unidos não hesitariam em usar “todo o poder econômico e militar” para defender a liberdade de expressão no mundo, repercutiu no Brasil e levantou questionamentos sobre os impactos dessa postura em meio ao julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro no Supremo Tribunal Federal (STF).
Para o advogado Guilherme Morais, especialista em Processual Civil, a ameaça de Washington deve ser vista com cautela. Ele lembra que, embora os Estados Unidos tenham instrumentos de pressão — como suspender acordos comerciais, reduzir cooperação em áreas estratégicas ou até influenciar outros países — medidas mais duras são pouco prováveis. “O Brasil é um parceiro estratégico de longa data, e ações drásticas também prejudicariam os americanos”, disse.
Morais reconhece que há precedentes internacionais, como Rússia, Venezuela e Mianmar, mas reforça que o caso brasileiro é diferente. “Aqui, as decisões seguem dentro do devido processo legal, o que torna difícil justificar sanções externas. Uma interferência desse tipo seria interpretada como tentativa de ditar como o Brasil deve conduzir sua Justiça, algo que fere diretamente nossa soberania”, avaliou.
Na prática, ele destaca que os efeitos seriam sentidos no dia a dia dos brasileiros caso houvesse medidas concretas. “O dólar poderia disparar, encarecendo combustíveis, alimentos e produtos importados. O agronegócio, que é uma das bases da nossa economia, enfrentaria barreiras para exportar, e até vistos para estudar ou trabalhar nos EUA poderiam se tornar mais difíceis de obter”, explicou.
A advogada Flávia Artilheiro, especialista em Direito Militar, vê o cenário atual como um dos mais tensos na longa história de relações entre Brasil e Estados Unidos. “O mais provável seria a ampliação das medidas já adotadas, como revogação de vistos e extensão da aplicação da Lei Magnitsky a outras autoridades. Uma ação militar é pouco plausível, mas este é, sem dúvida, o pior momento em mais de 200 anos de relações diplomáticas entre os países”, afirmou.
O especialista em Ciência Militar e oficial da reserva do Exército, Gustavo Lyrio, também avalia que não há risco de ruptura institucional, mas alerta para os efeitos econômicos de possíveis retaliações. “A democracia de uma nação não desmorona por fatores externos, e sim pelos internos. Contudo, sanções econômicas podem trazer dificuldades graves, porque quando a economia entra em recessão não há recursos para sustentar programas assistenciais, e aí o povo sente diretamente as consequências”, disse.
Ele ainda descarta cenários extremos. “Apesar do tom duro, não existe no Brasil um cenário que abra espaço para um golpe apoiado pelos Estados Unidos e nem uma guerra declarada”, avaliou.
Por fim, os especialistas também frisam um ponto: a crise diplomática exigirá maturidade política. “A democracia brasileira já passou por crises e segue em pé. Qualquer pressão externa traz desgaste, mas não desmonta nossas instituições. O desafio será conduzir esse momento com diálogo e maturidade política”, conclui Morais.